Véspera de feriado é um fenômeno absolutamente curioso. Trata-se de uma crônica perfeita da vida real. Um retrato, dos mais fiéis, do estilo de vida contemporâneo.
A começar pela ansiedade. Ela é quase um bem – pessoal e intransferível.
Cada um tem sua maneira peculiar de manifestá-la. Alguns começam dias antes. Cultuando o recesso como se fosse o último gás de sua longa maratona. Esperam por ele. Ávidos.
Há quem tente manter a compostura, mas escancara sua apreensão entre as incontáveis olhadas para o relógio. Nem os ponteiros aguentam tanta agonia. Seguram-se ao máximo, até a metade do dia, geralmente.
A partir daí, rezam. Um silêncio sagrado, para que não surja nenhum tipo de imprevisto. Ao final, se tudo der certo, nem sorriem. Saem com pressa. Aliviados.
(Curioso como chegam ao trabalho felizes por saber que não terão que trabalhar nos próximos dias. Tão curioso quanto incoerente. O livre arbítrio parece até estar com a carteira assinada.). Era para ser só um parênteses.
No escritório ou no trânsito, a cabeça está em outro lugar.
Imaginando a viagem, o descanso ou seja lá o que for. Normal. O que menos se faz é estar focado no agora. Somos pescadores de distrações. Ou pescado por elas. Quer dizer… é tanta isca que até confunde.
De todas as formas, o feriado serve para fazer tudo aquilo que a semana não deixa. Um suspiro de tempo livre.
Geralmente, a culpa de tanta falta de tempo é do trabalho, da rotina, do calendário, de tudo… menos nossa. Acreditamos não ter escolhas, mesmo quando essas próprias escolhas ainda acreditam em nós.
Assim a cidade muda suas roupas. Põe suas perninhas de fora. Pessoas vão e vem. Velhos espaços são preenchidos por novidades. Novos ares, novas histórias. Bonito, muito bonito.
Uma pena! Que tamanho lampejo de euforia dependa de uma data.
(Marcelo Penteado)
4 respostas para “Feriado”
Faz parte do absurdo das nossas prioridades…. A gente cria uma rotina massacrante para ficar esperando por feriados que nós tirem dela. É uma questão de escolha….
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Muito bom texto! Obrigada!
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Analisar o comportamento humano frente a situações corriqueiramente cotidianas, numa conversa informal, simples. Agora, fazer um texto com essa abordagem, fica por demais reflexivo, diria, até com um viés filosófico. O relógio interno que controla o tempo cobra: o que fiz hoje? É preciso uma grande lista para não ser classificado como inútil, preguiçoso, indolente. O que você vai fazer no final de semana? Dormir. Ou então meu final de semana será repleto de tantas e tantas atividades de lazer que iniciarei a semana com alto grau de estresse. Alguns dizem que o ócio é necessário para pensar na própria vida, a comum frase “parar para pensar”. Será que paramos para pensar? Será necessário suspender nossas atividades cotidianas para refletir acerca delas?
“Aquele que é mestre na arte de viver faz pouca distinção entre o seu trabalho e o seu tempo livre, entre a sua mente e o seu corpo, entre a sua educação e a sua recreação, entre o seu amor e a sua religião. Distingue uma coisa da outra com dificuldade. Almeja, simplesmente, a excelência em qualquer coisa que faça, deixando aos demais a tarefa de decidir se está trabalhando ou se divertindo. Ele acredita que está sempre fazendo as duas coisas ao mesmo tempo” (Domenico de Masi, O Ócio Criativo).
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Bacana!
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