
Desperta um homem pela manhã. Seus lentos olhos abrem, embora já atrasados para a cidade. Levanta-se, o homem, puxado, recorrido pelos anseios venenosos que o tiram o sono.
Ao banho, seu traje, hábitos de homem. Cruza cômodos, incômodo, deixando para trás sua oportunidade de descanso. Na cozinha, o último respiro. Busca ao redor, entre armários, dentro da geladeira – respostas, saídas.
Do que alimentar-se, quando o apetite falha?
Enxerga, o homem, um frasco de mel. Doce, saudável, um suspiro de vida. Em um canto isolado, uma garrafa indecisa. Convidado, caminha até ela, com olhar de agrado.
Segura-a, cai-se em surpresa: pares de formigas boiam, mortas, em plena recompensa ao êxtase – supõe. Mumificam-se, reféns de um sonho glorioso, na atmosfera mais abastada e afortunada de suas perspectivas.
Boiam, mortas.
Pequeno demais o mundo. Os sonhos. Do tamanho de uma garrafa. Doces crenças. O silêncio do universo coube naquela cozinha. O silêncio da percepção de um homem sobre sua natureza.
(Marcelo Penteado)
3 respostas para “Mel”
Belo texto. Qual formiga queremos, às vezes, morrer ao usufruir um sonho, um doce sonho, na beleza instantânea de termos conseguido nos deleitar em mel, em delícia.
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“(…) O silêncio do universo coube naquela cozinha. O silêncio da percepção de um homem sobre sua natureza.”
Silêncio. Demanda inúmeras reflexões e aprendizados. Poderíamos inferir que o silêncio é a gentileza do perdão que se cala e espera o tempo.
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O despertar de todos nós, ou quase todos. Incrível, como observamos as formigas e seus exércitos, sem entender porque movimento tão frenético…
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