
“– Você não vê que está nublado?!” – afirmou o pessimismo – “E ainda teima em perguntar a razão de eu não estar me sentindo bem. Todo este céu poderia estar azul. Por onde se enfiou o sol, ser único capaz de aquentar toda esta frieza social, espacial e humana?” – Com seu ar rabugento e um tanto quanto descrente, insistia:
“– Repare que o verde dessas árvores ficou até meio cinza. Ô, dia feio! Dias como este não merecem figurar o calendário. Um desânimo, uma nostalgia para lá de amargurada. Tão intragável que da nem vontade de viver.” – queixou-se.
Muitos ouviam o pessimismo com atenção. Procuravam sentidos, significados para justificar o som persuasivo de suas palavras. Balançavam a cabeça, timidamente. Assim que entravam pelos ouvidos, buscavam, no cérebro, alguma identificação.
Convincente é o discurso deste grande orador. Dá vida e projeção aos seus lamentos. Quase irresistível discordar que cinza seja tão triste, embora cinza seja apenas uma cor e tristeza outra palavra qualquer.
Por um mundo democrático, não tardou para chegar a corrente otimista. Dizem as más línguas que ela não é nada fácil de achar. No entanto, em revés às críticas sobre sua frequência, cá vem o próprio otimismo com sua enérgica intensidade:
“– É verdade, está nublado!” – concordou – “Que pouco importa a dança dos céus? Tal qual chove, chove amores! O sol também precisa descansar. Vejo nas nuvens uma camada sedosa, que filtra o calor para dar sombra às arvores! Quem mais daria sombra às arvores, para que possam elas nos dar sombras, em dias de sol?” – indagou:
“– Respiramos o mesmo ar, por que insiste em ver outras coisas? Tristes mesmo são as entonações de suas palavras, que, segundo a linguagem, neutras nasceram.” – enquanto logo prosseguiu – “A nostalgia é a saudade mal compreendida. Sentir falta não pode ser sinônimo de se sentir incompleto. Dê-se uma chance de sentir inteiro, hoje, independente de tudo e a saudade será tão linda quanto o sorriso que brotará em você”.
Alguns se calaram. Ouviram atentos aos dois discursantes. A verdade é que ambos possuem razão. Afinal, a razão é uma linguagem lastrada nas palavras dos homens. Contudo, o entendimento não se contenta apenas com palavras, precisa consultar o sentimento experimentado antes de uma decisão.
Assim, pois, como em uma arbitrariedade qualquer, a vida decidiu que qualquer fato seja passível de debates como o anterior. Somos tudo, menos vítimas. Ouvimos, escolhemos e batemos o martelo. É nossa absoluta responsabilidade sobre qual versão acreditar como a verdadeira sentença. Somos juízes de nenhuma verdade, embora ministros de muitas escolhas.
(Marcelo Penteado)
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